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Editor: Klaus Schumacher

Colaboradores: Rafael Araujo Iizuka e Vinícius Furtado


Introdução

“Estou com dor de cabeça”. Certamente você já falou esta frase ou ao menos ouviu alguém a dizendo. Seja agora, ou há nove mil anos atrás, a cefaléia sempre incomoda e diminuí, em alguns casos, de maneira significativa o rendimento das atividades diárias. Em casos mais graves, são dores incapacitantes que acometem o indivíduo periodicamente.

A dor de cabeça, sintoma que também recebe o nome de cefaléia, é uma das queixas mais frequentes no ambulatório, estando entre os 20 principais motivos que levam um indivíduo a procurar o médico. Estima-se que a prevalência da cefaléia beira os 100%. Isto quer dizer que quase todas as pessoas terão pelo menos um episódio doloroso na vida.

Neste pequeno artigo, abordaremos a cefaléia a partir de várias perspectivas, caracterizando-a desde o seu emergir na história até os seus vários fatores causais.


O pesar da cabeça através da história

Através de pesquisas arqueológicas deduziu-se que essa dor já incomodava nossos antepassados da pré-história. Pensava-se que o sofrimento físico era causado por espíritos maus que haviam invadido a cabeça e ali se instalado. A resolução do quadro seria conseguida pela abertura do crânio. Diz-se que através deste método os espíritos sairiam e deixariam de causar incômodo. A retirada de parte do osso craniano ainda é feita hoje em dia e chama-se trepanotomia ou craniotomia.

Craniotomia

Fonte: cistosaracnoide.org/oque.html

Existem evidências como o papiro de Ebers (1550 a.C.) – um dos tratados médico mais antigo encontrado que além de conter a menção de dores na cabeça continham seu tratamento. Muito embora o destino terapêutico se baseasse na premissa de que os Deuses curassem, foi neste ambiente cabalístico que uma das primeiras terapias não-farmacológicas eficaz foi criada. A cabeça do combalido era envolta por uma faixa de linho branco por um lado, do outro, estava presa a um crocodilo de barro com trigo na boca. Os nomes de seus deuses eram colocados na faixa. De fato, havia melhora da dor, possivelmente, devido à compressão dos vasos dilatados.

Papiro de Ebers

Fonte: historiasdenefertari.blogspot.com

Hipócrates, pai da medicina, não poderia ter deixado de contribuir intelectualmente para este constructo. Muitas dores de cabeça vêm acompanhadas de perturbações gastrintestinais e tem remissão temporária com o vômito. Baseado nisto, montou a teoria de que ela seria causada por gases gástricos que ascendem à cabeça. Também percebeu que estas crises dolorosas poderiam ser incitadas pelo exercício físico e pelas relações sexuais. Como remédio ao mal da cabeça, Hipócrates recomendava o consumo de folhas de salgueiro, ricas em salicina. No século XIX, a salicina reapareceu como componente de alguns medicamentos analgésicos, provando mais um acerto do grande intelectual ateniense.

Já na Idade Média, a acusada de tal proeza maléfica era uma pedra. As pessoas que sofressem de epilepsias, crises cefalálgicas ou demência teriam em sua cabeça uma pedra que desencadearia todos estes problemas. Logo, a solução é óbvia: retirá-la de lá.

Somente no primeiro terço do século XIX descobriu-se um potencial remédio para dor de cabeça, particularmente, para a enxaqueca (também conhecida como migrânea). A substância é agora conhecida como “alcalóide do ergot” ou “alcalóide do esporão do centeio”. Sua ocorrência natural se dá em um fungo - Claviceps purpúrea - que inside sobre plantações de cereais. Em épocas anteriores, esta mesma substância causava envenenamentos ocasionais em certas regiões da Europa; os sintomas produzidos eram perturbações mentais e vasoconstrição periférica intensamente dolorosa que poderia levar à gangrena. O quadro era conhecido como Fogo de Santo Antônio. Baseando-se nesta substância, durante o século XX, criou-se a ergotamina, um dos principais compostos usados no tratamento das crises enxaquecosas.


Dor de cabeça na Literatura

Na obra “Quando Nietzsche chorou”, do médico psiquiatra Irvin D. Yalom, um dos protagonistas, Friedrich Nietzsche, tem crises de dor enxaquecosa terríveis e muito frequentes. Em certo ponto do discorrer da história Dr. Josef Breuer, médico que ajudou a fundar a psicanálise, trata a dor de cabeça de Nietzche. Veja nesse pequeno trecho retirado do livro:

Capa do filme

Fonte: flabbergasted2.files.wordpress.com

“(...) Minha cabeça... vejo luzes cintilantes... ambos os olhos! Minha aura visual... Breuer imediatamente assumiu sua postura profissional. Uma enxaqueca está tentando se materializar. Nesse estágio, podemos detê-la. A melhor coisa é cafeína e ergotamina. Não se mexa. Volto já já. Saiu correndo do quarto e se precipitou escadas abaixo até o balcão de enfermagem central e, depois, a cozinha. Retornou em poucos minutos carregando uma bandeja com uma xícara, um pote de café forte, água e alguns tabletes. -Primeiro, engula estas pílulas: ergotina e alguns sais de magnésio para proteger seu estômago do café. Depois, quero que beba todo este pote de café. (...)”

Neste trecho o Dr. Breuer faz uso da ergotamina, a qual já foi citada anteriormente, e cafeína para que a crise dolorosa não se instale. O romance tem como cenário o fim do século XIX e deixa claro que, mesmo nesta época, já se sabia que ao atuar precocemente previne-se o quadro doloroso ou, ao menos o abranda. Nos dias atuais, esta premissa ainda continua válida para alguns tipos de dores de cabeça. E muitos medicamentos que tratam especificamente da enxaqueca são mais eficazes quando ingeridos durante os sintomas de aura – que são avisos prévios que uma dor se instalará, tal qual contado no trecho acima. Curioso também é dizer que atualmente muitos medicamentos para o tratamento da enxaqueca são baseados nas substâncias utilizadas pelo Dr. Josef Breuer há mais de cem anos – cafeína e ergotamina.

Houve, na terapia da enxaqueca – doença crônica que acomete cerca de 10-20% da população mundial – uma mudança no perfil do momento de intervenção, deixando de ser apenas nas ocasiões agudas e ganhando importância ímpar na prevenção. Alguns medicamentos indicados para enxaquecosos crônicos, que se tomados diariamente, impedem que haja manifestação aguda do problema evitando-se o incômodo de somente tomar medicamentos nos momentos de crise dolorosa.


Etiologias da dor de cabeça

ATM

Fonte: www.ateliedenovidades.com.br/blog

Os episódios de dor de cabeça têm inúmeras causas. Entre elas, podem-se citar como indutores da cefaléia: o esforço, a infecção, os medicamentos, o estresse, a disfunção da articulação temporomandibular (responsável por permitir a mastigação dos alimentos – ela se situa um pouco a frente do pavilhão auditivo, é justamente ela que se mexe enquanto mastigamos), a hipertensão, o estado pós-traumático (responsável pela maioria dos quadros dolorosos), algumas neoplasias do SNC, os acidentes vasculares cerebrais (também designados de AVC), quadros de intoxicação aguda ou insidiosa, distúrbios endócrinos, entre muitos outros.


Referências

ASPECTOS HISTÓRICOS DA DOR DE CABEÇA. Disponível em: http://historia.abril.com.br/ciencia/dor-cabeca-eterna-435737.shtml. Acessado em: 6/11/2010.

Dale MM, Rang HP. Farmacologia. 6ªed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007.

Donald K, Cherry AW, David AW. National Ambulatory Medical Care Survey: 2000 Summary. CDC 2002; 328:1-31.

DOR DE CABEÇA. Disponível em: http://www.brasilescola.com/doencas/dor-cabeca.htm. Acessado em: 6/11/2010.

Fauci AS, Braunwald E, Kasper DL, Hauser SL, Longo DL, Jameson JL, Loscalzo J, editors. Harrison medicina interna. 17th ed. Rio de Janeiro: McGraw-Hill; 2008.

HISTÓRIA DA MEDICINA. Disponível em: http://e-groups.unb.br/fm/hismed/arquivos/medicina_no_antigo_egito.pdf. Acessado em: 6/11/2010.

Queiroz LP, Peres MF, Piovesan EJ, Kowacs F, Ciciarelli M, Souza J, Zukerman E. A nationwide population-based study of tension-type headache in Brazil. Headache. 2009 Jan; 49(1):71-8.

Tierney LM, Henderson MC. The patient history: evidence-based approach. New York: McGraw-Hill; 2005.


Sites sugeridos

1. Sociedade Brasileira de Cefaléia

2. Enxaqueca e dor de cabeça

3. Cefaléias Online

4. Dor de cabeça (Drauzio Varella)

5. Dor de cabeça online

6. HowStuffWorks

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